sexta-feira, 11 de agosto de 2023

O poder e a glória; Cap 5, deuses Falsos, Timothy Keller

"...o historiador holandês Johan Huizinga escreveu: “Vivemos em um mundo possuído. E sabemos disso”.

...há outro candidato a preencher esse vazio espiritual. Também podemos nos voltar para a política. Podemos ver nossos líderes políticos como “redentores”, nossa orientação política como uma doutrina de salvação, e converter nosso ativismo político em uma espécie de religião.

Um dos indicadores de que um objeto está funcionando como um ídolo é quando o medo se torna uma das principais características da vida. Se estabelecermos o ídolo no centro da nossa vida, nós nos tornaremos dependentes dele. Se nosso deus falso for ameaçado de alguma forma, nossa reação será o pânico total. Não diremos: “Que vergonha, como é difícil”, mas, sim: “É o fim! Não há esperança!”.

Se um dos dois partidos ganha uma eleição, certa porcentagem do lado perdedor fala claramente em deixar o país. Ficam ansiosos e temerosos em relação ao futuro. Depositaram em seus líderes políticos e na política o tipo de esperança que outrora havia sido depositado em Deus e na obra do evangelho. 

Outro indicador de idolatria em nossa política é que os oponentes nunca estão equivocados, mas são sempre maus. 

O filósofo holandês-canadense Al Wolters ensinou que, na visão bíblica das coisas, o principal problema na vida é o pecado, e a única solução, Deus e sua graça. A alternativa a essa visão consiste em identicar algo além do pecado como o principal problema do mundo e algo além de Deus como o principal remédio. Demoniza-se assim algo que não é completamente mau, e transforma-se em ídolo algo que não pode ser o bem supremo.

Reinhold Niebuhr foi um importante teólogo americano de meados do século 20. Ele acreditava que todos os seres humanos lutam contra um sentimento de dependência e impotência. A primeira tentação no jardim do Éden foi um ressentimento dos limites que Deus nos impusera (“… não comerás da árvore…”, Gn 2.17) e a busca de sermos “como Deus” tomando o poder sobre nosso destino. Cedemos a essa tentação e agora ela faz parte da nossa natureza. Em vez de aceitarmos nossas finitude e dependência de Deus, procuramos desesperadamente maneiras de assegurar-nos de que ainda temos poder sobre nossa vida. 

Niebuhr acreditava que nações inteiras tinham “egos” corporativos e, como os indivíduos, as nações podiam ter complexos de superioridade e de inferioridade. 

Niebuhr reconheceu outra forma de “desejo de poder”. Você faz de sua filosofia política, não de seu povo, uma fé salvadora. Isso ocorre quando a política se torna “ideológica”. A palavra ideologia pode ser empregada para fazer referência a um conjunto de ideias acerca de um assunto, mas também pode ter uma conotação negativa mais próxima de sua prima, a idolatria. 

Acima de tudo, as ideologias ocultam de seus partidários a dependência que têm de Deus. 

Em qualquer cultura em que Deus está em grande medida ausente, o sexo, o dinheiro e a política ocuparão a lacuna para diferentes pessoas. Essa é a razão por que nosso discurso político é cada vez mais ideológico e polarizado. 

O único modo de lidar com todas essas coisas é curando nosso relacionamento com Deus. A Bíblia nos oferece um exemplo dramático dessa cura. É a história de um homem cuja vontade de dominar levou-o a tornar-se o homem mais poderoso do mundo.

"No segundo ano do seu reinado, Nabucodonosor teve sonhos. Isso lhe perturbou muito o espírito, e ele perdeu o sono. Então o rei mandou chamar os magos, os adivinhos, os feiticeiros e os astrólogos, para que lhe dissessem os seus sonhos; eles vieram e se apresentaram diante do rei. E o rei lhes disse: Tive um sonho, e estou aito para saber o que significa" 
(Dn 2.1-3). 
Nabucodonosor ficou profundamente perturbado com o sonho. 

Niebuhr argumenta que “o homem é inseguro e […] busca superar sua insegurança pela vontade de potência. […] Ele finge não ser limitado”.  
Os seres humanos têm bem pouco poder real sobre a própria vida. 
Resumindo, tudo o que somos e temos nos é dado por Deus. Não somos criadores infinitos, mas criaturas finitas, dependentes.

Daniel interpretou o sonho. 
"Ó rei, tu viste uma grande estátua em tua visão. Essa estátua, imensa e impressionante, estava em pé diante de ti, e tinha uma aparência terrível. A cabeça da estátua era de ouro fino; o peito e os braços, de prata; o ventre e o quadril, de bronze; as pernas, de ferro; e os pés, em parte de ferro e em parte de barro. Enquanto estavas vendo isso, uma pedra soltou-se sem auxílio de mãos e feriu a estátua nos pés de ferro e de barro, e os esmigalhou. Então o ferro, o barro, o bronze, a prata e o ouro foram despedaçados e viraram pó, como a palha das eiras no verão. O vento os levou sem deixar nenhum vestígio; porém a pedra que feriu a estátua se tornou uma grande montanha e encheu toda a terra"
(Dn 2.31-35). 
A estátua representava os reinos da terra. 

O sonho era um chamado à humildade. 
Quem está no poder deveria ver que não o conquistou, mas apenas o recebeu de Deus, e que todo poder humano desmorona no final. Nabucodonosor estava sendo chamado a mudar sua concepção de Deus.

Nabucodonosor aceitou a mensagem. 
"Então o rei Nabucodonosor caiu com o rosto em terra e reverenciou Daniel, e ordenou que lhe trouxessem uma oferta de cereal e incenso. O rei respondeu a Daniel: Verdadeiramente, o vosso Deus é Deus dos deuses, e o Senhor dos reis, e o revelador dos mistérios, pois pudeste revelar este mistério" 
(Dn 2.46,47). 

O rei confessou que Deus é “o Senhor dos reis”. O homem mais poderoso no mundo se prostrou — um gesto de humildade bastante distinto do orgulho costumeiro de Nabucodonosor.

No capítulo 4, Nabucodonosor se descreve como estando em seu palácio, satisfeito e próspero, quando teve outro sonho, este não só perturbador, mas também aterrador.
"Com medo e tremor, o rei mandou chamar Daniel, que ouviu o sonho e empalideceu. Depois de permanecer em silêncio por algum tempo, o profeta apresentou a interpretação. Esta é a interpretação, ó rei: é o decreto do Altíssimo, que é enviado ao rei, meu senhor: Tu serás expulso do meio dos homens, e a tua morada será com os animais do campo, e te farão comer grama como os bois; serás molhado pelo orvalho do céu, até que passem sete tempos, até que reconheças que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens e o dá a quem quer. E quanto ao que foi dito, que deixassem o tronco com as raízes da árvore, o teu reino voltará para ti, depois 
que tiveres reconhecido que o céu reina. Portanto, aceita o meu conselho, ó rei: Abandona teus pecados, praticando a justiça, e renuncia às tuas maldades, usando de misericórdia com os pobres, se quiseres prolongar a tua tranquilidade" 
(Dn 4.24-27). 

O primeiro sonho, de certa forma, havia sido uma lição acadêmica. Falava em termos gerais sobre o caráter de Deus e o caráter do poder humano. 
Dessa vez, Deus estava sendo mais pessoal. As lições acadêmicas não tinham ajudado. O rei continuava um tirano. Ainda oprimia determinadas raças, classes e os pobres (v. 27). 
Agora, Deus lhe ensinaria o que ele precisava aprender. Mas há esperança. A árvore seria cortada, mas o tronco permaneceria no chão para voltar a crescer. Deus não estava à procura de retribuição, vingança ou destruição. A questão era disciplina — dor imposta com o propósito de correção e redenção.

"Depois de doze meses, quando andava no palácio real da Babilônia, o rei disse: Não é esta a grande Babilônia que ediquei para a morada real, pela força do meu poder, e para a glória da minha majestade?" 
(Dn 4.29,30).

Na mesma hora, Nabucodonosor passou por um período, ao que tudo indica, de doença mental grave, em que ficou muito demente para habitar no interior do palácio, passando a viver em seu entorno, entre os animais.

O orgulho faz de você um predador, não uma pessoa.  
Foi o que aconteceu ao rei.

Conforme as palavras do testemunho dele mesmo: 
"Mas ao fim daqueles dias, eu, Nabucodonosor, levantei os olhos ao céu e voltou a mim o meu entendimento, e eu bendisse o Altíssimo, e louvei e gloriquei ao que vive para sempre; porque o seu domínio é um domínio eterno, e o seu reino é de geração em geração. […] No mesmo tempo, voltou a mim o meu entendimento; e voltou a mim a minha majestade e o meu resplendor, para a glória do meu reino. Os meus conselheiros e os meus nobres se preocuparam; e fui restabelecido no meu reino, e minha grandeza se tornou ainda maior" 
(Dn 4.34,36).

Nosso coração declara: “Eu me levantarei e serei como o Altíssimo por amor de mim mesmo”
Jesus, no entanto, disse: “Eu me humilharei, descerei bem baixo, por amor a eles”
Tornou-se humano e foi para a cruz a fim de morrer por nossos pecados (Fp 2.4-10). 
Jesus perdeu todo poder e serviu para nos salvar. 
Morreu, mas isso levou à redenção e à ressurreição.

O exemplo e a graça de Jesus curam nosso desejo pelo poder. 

Ao abrir mão de seu poder e servir, tornou-se o homem mais influente que já viveu. 
Todavia, ele não é apenas um exemplo; é um Salvador. 
Somente se reconhecermos nosso pecado, necessidade e impotência e nos rendermos à sua misericórdia, então nos tornaremos seguros em seu amor e, assim, seremos revestidos de poder de uma maneira que não nos leva a oprimir as pessoas. 
A insegurança se foi, o desejo intenso de poder foi arrancado pela raiz. 
Como um pregador disse, certa vez: “O caminho para cima é descer; o caminho para baixo é subir”."

Trecho do Cap 5 do livro deuses Falsos, Timothy Keller. 

MilaResendes 

Nenhum comentário: